"Sweeney Todd" no Teatro Aberto

Já com algumas semanas de atraso, vou relatar duas idas ao teatro cujas temáticas versavam sobre barbeiros. As formas de o fazerem é que eram diametralmente opostas, já que a primeira de um thriller musical se tratava e a segunda de uma peça para crianças baseada numa famosa ópera. Este artigo falará sobre a primeira. A segunda ficará para o artigo a seguir.
Assim sendo, eis que me dirigi então ao Teatro Aberto para ver a saga do terrível barbeiro de Fleet Street, “Sweeney Todd”, de Stephen Sondheim, cujo elenco estava literalmente pejado de amigos, amigas, colegas e conhecidos. E fiquei deslumbrada. Um trabalho verdadeiramente de arrepiar, a um nível que chega a ultrapassar peças a que tenho assistido “lá fora”. Perfeitamente irrepreensível, todo o leque de valências que contribuiu para que este fosse um dos melhores espectáculos a que tenho assistido nos últimos anos.
Mas comecemos do início, que é contextualizando um pouco a peça: baseado numa versão de um melodrama inglês do sec. XIX, em que a realidade e a ficção se misturam tal qual uma lenda, Sweeney Todd é um musical que narra a história de um barbeiro que, após vários anos passados nas galés por uma condenação injusta de um juiz que lhe cobiçava a mulher, regressa a Londres para reencontrá-la e à filha de ambos e para se vingar de quem lhe destruiu a vida. Esta vingança manifesta-se numa série de crimes macabros, que o tornaram conhecido como “o terrível barbeiro de Fleet Street”.
Em Portugal, este musical foi em 1997 no Teatro D. Maria II pela primeira vez interpretado nas vozes de Jorge Vaz de Carvalho, Eduardo Viana, Helena Afonso, Pedro Chaves, Luis Rodrigues, Ana Ferraz, António Wagner Dinis, Carlos Guilherme, José Manuel Araújo, Helena Vieira, Henrique Feist e Luis Castanheira.
Nesta produção, manteve-se uma equipa de sucesso na encenação de João Lourenço, direcção musical de João Paulo Santos, cenografia de Jochen Finke, figurinos de Renée Hendrix e desenho de luz de João Lourenço e Melim Teixeira. A acrescentar a coreografia de Carlos Prado e criou-se a base para uma obra perfeita.
Para essa perfeição muito contribuiram os meus amigos cantores deste elenco de luxo (vou falar apenas dos meus amigos, colegas, enfim, das pessoas que eu conheço!!!): começando por um dos maiores responsáveis pela altíssima qualidade do espectáculo, Sweeney Todd em pessoa, o meu amigo Mário Redondo: foi arrepiante, preciso, fantástico, de uma segurança de invejar e de altaneirar. De cada vez que a sua implacável lâmina zurzia os pescoços das suas vítimas e se fazia ouvir aquele lancinante guincho, os meus cabelos até se punham em pé. Talvez também um pouco porque o guincho estava realmente muito alto. Mas a quem interessa isso? Perante a qualidade de uma interpretação daquelas... Logo a seguir vem uma Senhora Lovett de ir às lágrimas, com a interpretação da Ana Ester Neves. Eu particularmente prefiro uma cantora/actriz de carácter para este papel, mas a Ana esteve muito bem, sem dúvida que sim. A Carla Simões fez uma Johanna muito ao seu estilo, delico-doce e bem cantada. A Mendiga da Silvia Filipe esteve simplesmente soberba. Para quem já soubesse o fim da história, como era o meu caso, as suas tiradas sarcásticas faziam rir e tremer de comoção em simultâneo. O Tiago Sepúlveda fez um Pirelli muito engraçado e bem interpretado. O Henrique Feist cantou e sensibilizou no seu Tobias Ragg, ainda, volvidos dez anos. Por entre os cantores do coro, encontravam-se os meus colegas e amigos Ana Patricia Figueiredo, Ana Urbano, João Oliveira (que foi o primeiro a abrir a boca na peça!), Lúcia Lemos, Miguel Coelho, Rita Crespo e Tânia Viegas. Os restantes não conheço mas gostava de conhecer, tal foi o nível de qualidade da peça a que assisti naquela noite.
Três vivas para as produções portuguesas! Há que mostrar que os artistas portugueses estão, sim, ao nível de ombrear com qualquer coisa que se possa encontrar por aí. E que ninguém se atreva a duvidar, senão...

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